quinta-feira, 7 de junho de 2012

O show da vulnerável Xuxa

Por Pedro Roberto Donel,
advogado (OAB-SC nº 11.888)

Causou comoção a entrevista da Xuxa no Fantástico, dizendo-se vítima de violência sexual, múltiplas vezes, na sua infância e adolescência. Não faz tempo o STJdeixou de condenar um homem que manteve relações íntimas com três meninas menores de 14 anos, por entender que a presunção de violência ficaria afastada pelo fato de elas possuírem um histórico de prostituição, o que também repercutiu na mídia nacional e gerou protestos de ONGs, da secretária dos Direitos Humanos do governo federal e até do escritório da ONU.

A questão do hoje chamado estupro de pessoa vulnerável recebe atenção especial dos legisladores, com constante alteração da lei, visando aprimorá-la. Até o ano de 2009, o sexo, mesmo consentido, praticado com menores de 14 anos era considerado violência presumida, e nesse caso o juiz poderia afastar a presunção diante das circunstâncias fáticas, como por exemplo, o comportamento pregresso da vítima, e absolver o acusado.

A Lei nº 12.015/2009 deixou de mencionar a violência presumida, considerando estupro todo ato de conotação sexual praticado com menor de 14 anos, incluindo um beijo na boca. Em tese, não restaria ao aplicador da lei alternativa senão a condenação do acusado de tal prática, pois o critério passou de subjetivo para objetivo (excluído da lei o termo presunção).

Entretanto, não é o que vem acontecendo na prática. Mesmo depois da mudança da legislação o juiz observa a circunstância em que o fato ocorreu e não apenas a letra fria da lei e, em alguns casos, usando bom senso, absolve. Imaginem um namoro entre um jovem de 18 anos e uma menina prestes a completar 14 anos, inclusive, com a anuência dos pais. A simples troca de beijos entre ambos é considerada crime, com pena mínima de 8 anos de reclusão. A lei não faz nenhuma distinção entre fatos, tarefa que cabe ao juiz.

Portanto, o STJ ao julgar o caso das meninas prostitutas aplicou a lei da época do fato, que permitia afastar a presunção de violência em face das circunstâncias do caso, orientação antiga até do STF. É consabido que em Direito Penal a lei não retroage para prejudicar o acusado. Por conta da repercussão do caso, o STJ soltou nota dizendo que "não institucionalizou a prostituição infantil; prostitutas não podem ser estupradas com emprego de violência real; não incentiva a pedofilia; não promove a impunidade; e não atenta contra a cidadania". Portanto, a questão é polêmica.

Dois dias antes do pronunciamento da Xuxa Meneghel, a lei novamente mudou para considerar como início do prazo prescricional dos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, o dia em que a vítima completar 18 anos. Trata-se da Lei Joanna Maranhão (nº 12.650/2012). Portanto, agora a vítima não depende da boa vontade dos seus representantes legais para denunciar o crime. Pode fazer isso tão logo complete a maioridade.

Importante a mudança, pois o réu nesse tipo de crime é sempre um conhecido, padrasto, vizinho, namorado, tio e até o pai, o que acaba servindo de desculpa para a o acobertamento pela família.

Após essa declaração no Fantástico, o número de denúncias de abuso contra crianças e adolescentes cresceu, mas para a Xuxa não há mais possibilidade de justiça, diante da prescrição.

Pena, porque a rainha dos baixinhos, de 49 anos, deixou transparecer que continua vulnerável.

Fonte:http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=27366&lat=1

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